Xiiii,
    professora, deu um "branco" II 
  
         QUANDO TODA A CLASSE OU PARTE EXPRESSIVA DELA
PARECE NÃO DAR CONTA DO CONTEÚDO 
 
     
  
     
CASO
    O PROBLEMA DE MEMÓRIA QUE O ALUNO APRESENTA SE MANIFESTE DE FORMA OCASIONAL e,
    portanto, atinja-o em uma ou outra circunstância sem constituir algo
    rotineiro em seus caminhos pela aprendizagem, entre as causas prováveis
    estão distúrbios do sono, crise de ansiedade e uso de drogas, fatores que
    fogem do controle das estratégias de ensino e, por serem de natureza física
    ou psicológica, requerem cuidados específicos. 
     
Se,
    ao contrário, o estudante parece estar distante dessas condições e SEUS PROBLEMAS DE MEMÓRIA SE
    APRESENTEM PERSISTENTES, É NECESSÁRIO TOMAR DUAS LINHAS DE AÇÃO: 
A PRIMEIRA é verificar se não está existindo
    um excesso de estímulos, isto é, se
    a carga de temas que o aluno necessita saber não se apresenta maior que a
    possível. A memória, tal como o estômago, possui limites, que variam de
    uma para outra pessoa e, assim sendo, não pode abrigar uma carga de
    informações que se coloca no padrão de exigência adulta. 
     
Para esses casos, o recurso é
    priorizar temas a serem aprendidos, selecionar conteúdos efetivamente
    imprescindíveis e, dessa forma, exigir da memória apenas o que ela pode
    oferecer. 
     
Essa situação, entretanto, suscita
    uma interrogação: Como saber se estamos exigindo uma carga excessiva do
    estudante? 
     
A memória, como eu disse, varia de
    pessoa para pessoa, mas o grau dessa diversificação não exibe limites muito
    amplos. 
     
Se o que se exige do aluno, os
    colegas conseguem alcançar com relativa serenidade, isso significa que o
    limite desejado não se mostra abusivo. 
     
Limites abusivos existem quando
    toda a classe ou parte expressiva dela parece não dar conta do conteúdo e quando o estudante, mesmo
    demonstrando sincero esforço e planejamento de suas horas de estudo, revela
    estar distante das expectativas impostas. 
     
 A SEGUNDA causa de problemas de memória —
    que pode aparecer isoladamente ou agregar-se à primeira — DECORRE DE DIFICULDADES DE
    CONCENTRAÇÃO. Para essa
    situação, uma série de ações pedagógicas pode ajudar, e muito, os alunos. 
 
     
A dificuldade de concentração caminha
    junto com o desinteresse e, nessas circunstâncias, cabe bem mais
    responsabilidade por parte do professor que do estudante. 
  
     
NESSE SENTIDO, SERIA
    DESEJÁVEL QUE, EM TODAS AS AULAS, FOSSEM OBSERVADOS  PROCEDIMENTOS BÁSICOS, QUE SÃO OS SEGUINTES: 
     
1-  SIGNIFICAÇÃO NO QUE SE BUSCA
    APRENDER 
     
A memória humana teima em não
    guardar informações sem significado. Decorar que "Fabiana vai à praia
    com seu chapéu amarelo" é naturalmente mais simples que tentar
    memorizar que "De Béchar até Ghardaia percorre-se o contraforte do
    Atlas". Isso ocorre não porque existe impropriedade na segunda
    afirmação, mas, sim, por ser bem mais fácil imaginar uma pessoa chamada
    Fabiana usando um chapéu para se proteger do sol enquanto vai à praia que a
    segunda situação apresentada. 
     
O que aqui importa não é imaginar
    que algumas sentenças podem proporcionar mais significações que outras,
    mas, sobretudo, que cabe ao professor construir para os alunos as
    significações nos conteúdos que transmite, associando ou ajudando os
    estudantes a associarem os temas escolares a fatos ou ocorrências do
    cotidiano. 
     
É a velha história do
    "novo no velho", ou seja, a ideia de que fixamos na memória um
    novo saber quando este se associa a outro já existente em nossa estrutura
    cerebral. Isso
    explicaria, por exemplo, o fato de que um garoto interessado em
    automobilismo aprende muito melhor sobre Química se em uma aula é seduzido
    a pensar como um carro de fórmula 1 transforma combustível em velocidade. 
     
2-  QUALIDADE REFERENCIAL DAS
    ANOTAÇÕES FEITAS EM AULA 
 
     
 Existe um aforismo que afirma que
    "a caneta é a melhor memória que existe", e nessa sabedoria
    popular não há erro. Realmente,
    uma forma inteligente de descansar a memória é anotar. NO ENTANTO, QUANDO SE TRATA DE
    SABERES ESCOLARES, IMPORTA BEM MENOS A QUALIDADE QUE A QUANTIDADE DE
    ANOTAÇÕES e, nesse
    contexto, mais uma vez a ação do professor mostra-se imprescindível. 
     
Preparar um caderno, longe de
    significar atributo aleatório em que cada aluno o faz a sua maneira,
    representa uma importante estratégia de aprendizagem que cabe ao professor,
    com persistência, ensinar. 
     
Para boas anotações, nada melhor
    que criar mapas conceituais ou uma linha de seqüência de conteúdos que, por
    exemplo, associe-se a uma árvore ou a uma rodovia. 
     
Se o aluno associar certos
    conteúdos de um todo a raízes, alguns a um tronco e outros a galhos, ramos
    e, quem sabe, folhas, flores e frutos, memorizará melhor, pois, ao evocar o
    tema, verá suas partes na estrutura de um corpo — nesse caso, a árvore —
    que bem conhece. 
     
3-EMPREGO DE ESTRATÉGIAS
    QUE ASSOCIEM A MEMÓRIA À EMOÇÃO 
     
Busque suas memórias mais vivas e
    mais fortes e estará, por certo, encontrando
    as emoções mais intensas que viveu. 
     
Quando um tema se associa a uma ou
    mais emoções, agrega-se a nossa estrutura mental de tal forma que, em
    certos casos, torna-se difícil esquecê-lo, ainda que seja isso que se
    busque fazer. 
     
Nesse caso, a participação do
    professor é importante, ajudando seus alunos a fazerem uma reflexão na qual
    associarão os saberes que apreenderam a essa ou aquela emoção que viveram. 
     
Ainda que as emoções, é evidente,
    variem de um estudante para outro, não há um deles que não tenha momentos
    emocionantes para associar aos temas a que sua memória parece mais
    fortemente resistir. 
     
Cabe destacar que esse
    procedimento vale mais para questões mais complexas — até para não sobrecarregar a
    memória de lembranças emocionais —, mas todo aluno que é levado a pensar em
    um ou outro tema "vendo-o" na árvore que brincou, no rio que
    atravessou ou na partida de futebol que perdeu por certo terá a ajuda dessa
    emoção quando precisar do apelo a uma evocação. 
     
4- CONTEXTUALIZAÇÃO DO
    TEMA ESTUDADO 
     
Quando buscamos em um dicionário o
    sentido de "contexto", encontramos "encadeamento de
    idéias" e, se buscarmos "contextura", descobriremos que se
    refere a "entrelaçar" ou "ligar as partes de um todo".
    Se considerarmos esses dois sentidos na referência a um trabalho com as
    memórias em sala de aula, seria lícito afirmar que
    "contextualizar" equivale a encadear idéias, ligando parte de um
    todo ou, de forma ainda mais significativa, TRAZER O QUE SE ENSINA AO
    CONTEXTO DO ESTUDANTE, FAZENDO-O ASSOCIAR O APRENDIDO ÀS COISAS QUE FAZ EM
    SEU COTIDIANO E QUE CONHECE. 
 
     
É muito desinteressante para uma
    criança ou um adolescente "mergulhar" seu interesse em uma época
    que não viveu ou fingir-se um químico, físico ou matemático para ingressar
    na lógica dos números, assim como é indiscutivelmente desmotivador pensar
    em detalhes da morfologia litorânea ou da estrutura das regras gramaticais. 
     
 Os saberes escolares são mais
    facilmente arquivados na memória dele quando os fatos que ouve se associam
    ao futebol que joga, à novela a que assiste ou aos desafios que, no pátio
    da escola, todo dia enfrenta. 
     
BUSCAR MEIOS DE ENCADEAR ESSES
    SABERES E OS CONHECIMENTOS ESCOLARES CONSTITUI A ESSÊNCIA DA AÇÃO DOCENTE. O
    professor não ensina apenas porque sabe, mas, sobretudo, porque pode fazer
    seu saber chegar à memória de seu aluno e, por certo, por meio da
    contextualização mais facilmente conseguirá fazer isso. 
     
5- EMPREGO DE
    HABILIDADES OPERATÓRIAS DIVERSAS 
     
Quando se solicita a um estudante
    que descreva uma teoria,
    está cobrando-se de seu cérebro uma ação bem diferente da que se pede
    quando se solicita que, em vez de fazer uma descrição, ele compare. E quem é levado a descrever e,
    depois, a comparar retém com mais facilidade que aquela pessoa que apenas
    descreve ou compara. 
     
 DESSA FORMA, TRABALHAR EM SALA DE
    AULA AS HABILIDADES OPERATÓRIAS SIGNIFICA FAZER USO FREQÜENTE E CONTÍNUO DE
    VERBOS DE AÇÃO QUE INDUZEM O CÉREBRO A PROCEDIMENTOS DIFERENTES. 
 
     
 É por essa razão que todo
    aluno que repassa um saber observando, conferindo, seriando, localizando,
    relatando, combinando, demonstrando, classificando, analisando, aplicando,
    deduzindo, criticando, conceituando, especificando,  revisando e
    discriminando guarda o conhecimento de
    forma bem mais significativa que outro que se utiliza apenas de uma ou duas
    dessas habilidades operatórias. 
     
É evidente que elas são tantas e
    tão diversas que parece extrema ousadia recomendar, para amparo de melhor
    uso da memória, o emprego integral dessa lista, mas, se a tarefa é
    conscientemente dividida entre os professores e é proposta como desafios
    progressivos, começando pelas atividades mais simples, não será difícil
    perceber o quanto o uso delas interessa a uma aprendizagem significativa. 
     
6- ALTERNÂNCIAS QUANTO AO TIPO DE
    LINGUAGEM UTILIZADA (VISUAL, AUDITIVA E CINESTÉSICA) 
     
QUANDO
    LEMOS UMA MENSAGEM, ESTAMOS ATIVANDO NOSSA MEMÓRIA DE CONHECIMENTO,
    IDENTIFICAÇÃO OU PLANEJAMENTO, MAS SE, ALÉM DA LEITURA, PROCEDEMOS A UMA
    OPERAÇÃO DE ESCRITA, NOSSO CÉREBRO REAGE DE FORMA MAIS POSITIVA, POIS UMA
    AÇÃO A OUTRA SE SOMOU. 
     
SE, AO
    LADO DA LEITURA E DA REDAÇÃO, BUSCARMOS DESENHAR OU CONSTRUIR UM GRÁFICO
    ASSOCIANDO-O À MENSAGEM LIDA OU, QUEM SABE, FAZER DESTA UM VERSO, UMA
    PARÓDIA OU UMA COLAGEM, É QUASE CERTO QUE ELA SERÁ MAIS FORTEMENTE
    MEMORIZADA. 
     
É, pois, por essa razão
    que é inteiramente válido o professor passar os conteúdos para linguagens
    diferentes, estimulando o estudante, quando possível, a ler, cantar,
    desenhar, colar, fazer mímicas, construir paródias, buscar metáforas ou
    "fabular" sobre o tema (narrando-o em forma de uma fábula e,
    portanto, de maneira breve e alegórica). 
     
É certo que proceder dessa forma
    em relação a todos os conteúdos escolares é um absurdo. Entretanto, essa
    estratégia pode perfeitamente ser utilizada para alguns assuntos mais
    abrangentes, temas que se apresentam essenciais para a devida compreensão
    significativa de outros que a ele se encadeiam. 
     
7- USO (EVENTUAL) DE
    RECURSOS MNEMÔNICOS 
     
O maior inconveniente da
    utilização de uso de recursos mnemônicos (Que tem relação com a memória;
    que ajuda a memória) é que todas as outras alternativas propostas estão
    associadas à significação, enquanto esta
    é puramente mecânica. 
É por esse motivo que o uso deles
    deve ser restrito e circunstancial, mas nem por isso deixa de ser válido em
    uma ou outra oportunidade. Quando decoramos "Prometa telefonar,
    Ana" para gravarmos na memória etapas da mitose biológica (prófase,
    telófase e anáfase) ,estamos, na verdade, valendo-nos de recursos
    mnemônicos válidos para esse ou aquele conteúdo que, por sua natureza,
    necessite apenas de um exercício mecânico para ser armazenado na memória. 
     
8- VERBALIZAÇÃO CÊNICA
    DOS CONTEÚDOS A APRENDER 
     
 Uma forma extremamente interessante
    de fixar fatos na memória, ainda que mais significativa para
    alguns alunos que
    para outros, pois seu estilo de aprendizagem mostra-se mais cinestésico que
    visual, é, sempre que possível, ministrar uma
    aula diante do espelho sobre o tema que se deseja aprender. 
 
     
 Quando um estudante, em
    casa, assim age, não está apenas impondo uma repetição à memória, mas,
    principalmente, associando a ela seus gestos, sua voz e sua ação, que,
    fotografados pelo cérebro, podem mostrar-se expressivos quando for necessário
    lembrar o conteúdo. Mais
    uma vez, reitero o que antes disse. Uma estratégia como essa nem sempre é
    possível e, se para todos os temas o aluno necessitasse se valer desse
    recurso, seu tempo, por certo, seria insuficiente. Mas é justamente essa limitação que
    faz aflorar a importância de que o estudante saiba como melhor administrar
    o tempo de estudo e, dessa forma, priorizar uma ou outra estratégia,
    valendo-se deste ou de outro procedimento. 
     
Cabe, concluindo, repetir o que
    antes já foi destacado. 
     
  
Não mais deve existir espaço em nossas escolas para
    professores que apenas dominem saberes, ainda que tenham limitações para
    transmiti-los. Essa capacidade de transferência não constitui talento
    genético que se pode buscar em um ou outro, mas, antes, um esforço sincero
    de mais intensamente aprender a conhecer o cérebro humano e de se valer de
    suas  
ações para mais estimulá-lo. 
     
***** 
     
TEXTO : Xiiii, professora, deu
    um "branco" II ( com adaptações de Marizete Cajaiba) 
     
      
Celso Antunes é professor e
      psicopedagogo 
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
  
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